sábado, 26 de junho de 2010

Propagandas de minha vida

E a copa comendo solta. Vuvuzelas e Jabulanis dominam nossos sentidos. Vejo-as, ouço-as, sou capaz de sentir seus cheiros. Enlouqueço querendo saber como foi o retorno do time Francês depois do fiasco. E o da Itália? Tudo bem, isso só acontece a cada 4 anos. Mas decidi, dia desses, me libertar. Precisava de pitadas de assuntos outros, numa mente impregnada de informações futebolísticas. Por onde iniciar? Comecei pelos portais, espaços virtuais recheados de informações que poderiam abrandar minha ânsia. Tal qual um adolescente numa banca de revistas pornográficas, passei a correr os olhos freneticamente pelos sites, na busca de uma informação valiosa. Descobri coisas importantes: Fábio Júnior está separado e como foi o vestido usado por Sheila Mello no seu casamento. Um gato percorreu 3 mil quilômetros para encontrar seu dono. Descobri também que existe o “dia Internacional da Apreciação de Biscoito para Cães”. Fascinante, mas não era isso que procurava. Recorrei ao Google, o bom e velho. Acredito inclusive que o que não se encontra neste site de busca, não existe. Não deu outra: achei um trabalho de conclusão de curso cuja abordagem tratava da propaganda de medicamentos. Em tom crítico, a aluna de um curso da área de saúde, criticava a forma como era estabelecida a divulgação de determinados medicamentos. Citava vários exemplos. Pronto, minha mente acabava de receber informações preciosas, as quais desviaram meus pensamentos.
Confesso aos inúmeros leitores e leitoras deste blog, uns três ao todo, que tenho medo de determinadas propagandas. Hoje, em virtude da legislação, os comerciais não são como antes. Fui levado, em minha infância, a comer potinhos de iogurtes, pois estes substituiríam pequenos pedaços de carne (vulgarmente chamados de “bifinhos”). Tive que adquirir um par de kichutes, pois aquilo me daria uma liberdade sem fim. Poderia ir a qualquer lugar, pois seu solado com travas emborrachadas dariam a segurança necessária para os maiores desafios da minha pequena vida. Tive um boneco do Falcon, o qual muito me frustrou. No comercial da TV, aquele pequeno ser era ágil, rápido, andava de barco, brigava com seus inimigos. Quando abri a caixa, onde o mesmo estava atado com pequenos pedaços de arame, corri para libertá-lo. Coloquei-o sentado a minha frente, aguardando suas manifestações. Nada! Mantinha-se inerte, tal qual uma samambaia. Aquele ser inanimado apenas movia seus “olhos de águia”, caso eu acariciasse sua nuca! Ali havia um dispositivo, quase um nervo, que movia seus olhos...e isso era tudo o que ele fazia. Diz a lenda (o burro do computador queria crasear esse “a”) que um grupo de meninos, conversando acerca da aproximação do Natal, manifestavam seus sonhos de consumo, que deveriam compor a cartinha endereçada ao papai noel. Um dos meninos pediria um skate, pois com ele poderia subir ladeiras, andar em calçadas, andar em rampas. Um segundo pediria uma bicicleta cross, pois com ela poderia andar na areia, subir morros, saltar obstáculos. Um terceiro disse que, depois de observar bem o comercial de um absorvente íntimo, vulgo O.B, havia decidido por este presente. Mediante a exclamação dos amiguinhos, ele se justificou: “Na propaganda diz que com ele eu posso nadar, correr, andar de bicicleta, skate e muito mais”.
As propagandas de medicamentos, no meu tempo de balconista, também eram assustadoras. Se não bastasse o ímpeto de alguns, que não se bastavam em consumir seus medicamentos, como também indicavam para a vizinhança, haviam comerciais que me intrigavam. Na pequena drogaria onde trabalhava como balconista, na Vila Belmiro, em Santos, recebia mensalmente revistas que me estimulavam a ter determinados produtos na prateleira, pois seria nossa salvação comercial. Um medicamento, cuja função era regular o fluxo menstrual, tinha como abordagem: “Regule o fluxo de suas clientes e aumente o fluxo do seu caixa”. Outro, para má circulação, indicado para varizes, me abordava com a frase: “Tenha em sua prateleira, pois agora seu caixa vai bem das pernas”. Alguns fabricantes nos brindavam com cartazes, com crianças fofinhas, segurando frascos de xarope, esboçando um enorme prazer, como se houvessem deglutido suas guloseimas preferidas. Cartazes com fotografias de artistas eram encontrados nas paredes de algumas drogarias, assim como vemos em borracharias e bares. A diferença é que, ao invés de usarem minúsculos biquínis, alguns estavam até de aventais. Não seguravam pneus, nem bebidas alcoólicas, mas caixas de medicamentos. Os verbos utilizados nos comerciais, eram intimidatórios: “use”, “tome”, “tenha”, “compre”.
O tempo passou e não nos percebemos das mudanças na legislação. O mesmo controle feito sobre os comerciais de cigarros e afins passou a ser exercido sobre os medicamentos. O código de defesa do consumidor não permite mais que sejamos ludibriados. A sociedade evoluiu, assim como seu discernimento. Enquanto consumidor, algumas tentações são mais controladas.
Bom, tenho mais uma confissão a fazer: neste momento estou ao lado de minha JABULANI e minha VUVUZELA. Sem nenhuma habilidade para o futebol e sem paciência para aguentar o som emitido pelo instrumento, não resisti em ter tais aparatos de torcedor. Além disso, devo dizer que acabei de abrir uma caixa repleta de brinquedos da minha infância. Vasculhei atentamente e encontrei o que não queria. Lá estava meu Falcon. Inerte, deitado e com seus olhos fixos para o lado esquerdo. Como eu tinha esperança que ele tivesse feito suas malas e tivesse partido. Isso me consolaria e não me daria o peso de consciência de ter sido enganado. Humpf...

6 comentários:

Unknown disse...

Mas o importante é que apesar de o "Falcon" não ter feito as malas, ainda bem que a minha "Susi" não cresceu e criou as tais celulites e estrias que, com certeza, se instalaram em minha silhueta nestes anos todos e as "Barbies" das minhas filhas continuam com aquele corpinho de jovem americana magrela e de um ideal impossível de se atingir.

Lisia disse...

Colega, penso que posso colaborar com o assunto. Meu trabalho de conclusão da especialização em saúde pública tem como título "O Impacto da Mídia Relacionado ao Consumo de Medicamentos pelos Adolescentes" Trabalhei com adolescentes nas escolas na forma de oficinas, com abordagem qualitativa. A história do Falcon diz tudo. A propaganda vende o sonho. O sonho de ser magra(o), alta(o), abdomen de tanquinho, como evitar filhos etc... Quando se trata de medicamentos isto é perigoso. Acho este um assunto da maior importância. A conclusão do trabalho deixou uma preocupação, ficou comprovada a influência da propaganda de medicamentos sobre este grupo.

Amanda Moura disse...

Não desviando a seriedade do assunto, mas estou me acabando de rir com o garotinho do "O.B."...

Amanda & Rodrigo disse...

Em uma discussão com amigos durante essa semana, nos lembramos de certos brinquedos de nossa infância também, inclusive sobre suas propagandas. Um deles era a boneca Barbie, uma mesma boneca poderia ser aquilo que ela gostaria de ser, porém as profissões mais "simples" não erão lembradas. A Barbie foi médica, dentista, veterinária e até ginasta. Porque ela não podia ser farmacêutica, bióloga ou mesmo advogada? Creio que isso influêncio muitas meninas para tais profissões. Eu mesma queria ser veterinária. O corpo perfeito da tal boneca, é uma coisa impossível de se chegar. Só se eu não tivesse todas as minhas costelas e apenas metade dos meus órgãos, além de nunca poder menstruar.

Lisia disse...

Olá Marco, compartilhando este PPS

Remédios Antigos, a apresentação é interessantíssima, mesmo com dizeres e a bruxinha no final.


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Mosantosfarma disse...

Como seria o cheiro de uma jabulani? Aquele cheiro de plástico?(rs) A propaganda cria necessidades, nos envolve pela emoção, aguça quase todos os nossos sentidos, independente da tendência individual ser visual, auditiva ou sinestésica. Assim como ocorre a evolução em outras áreas, nessa também se faz. Acho que este é o momento do Min. da Saúde, que tem por objetivo promover e garantir a saúde da população, criar meios de também evoluir. Trabalho não faltará. Gostei do texto.