sexta-feira, 3 de setembro de 2010

É para termos medo das plantas?

Um dos meus 2 ou 3 seguidores disse uma coisa que achei sensacional: “De médico e louco, todo mundo tem um pouco”. Essa inovadora frase, que nunca na história desse País havia sido dita, me fez refletir de que a cura dos males que acometem a humanidade, sempre foi uma das maiores preocupações das sociedades, tendo sido, talvez, uma das maiores buscas do homem (e mulheres). Empirismos, simpatias e rezas, foram precursores de alguns dos tratamentos que dispomos hoje.

Para tratar deste tema, foi inevitável lembrar-me de minha infância, que passou por mim não faz tanto tempo. Quando criança, a cada soluço emitido, minha bondosa mãe se munia de um pedaço de linha vermelha embebido com sua própria saliva e colava-o em minha testa. Lá ia eu para escola com aquele badulaque, tal qual um pequeno indiano com o seu simbólico “terceiro olho”. Isso sem contar os sustos que ela me dava, já que acreditava ser este um tratamento eficaz para o descompasso gerado pelo meu pequeno diafragma. Quando me contundia, vinha ela com uma faca de inox e sobrepunha sobre o inchaço, fazendo o sinal da cruz. Para o meu terçol, bastava esquentar sua aliança, através de fricções na palma da mão e colocá-la sob o pequeno tumor inflamatório instalado em minhas pálpebras. Para inflamações na garganta: água morna com vinagre era a solução. Num armário do apartamento em que residia em Niterói, havia uma pequena coleção de frascos com pedaços de mim que se foram pelo caminho: meu primeiro dente, o resto do cordão umbilical e minhas amígdalas, popularmente conhecidas como tecido linfóide. Enfim, minha mãe era médica, farmacêutica e colecionadora de pedaços do corpo humano. Se buscarmos avaliar alguns dos atos cometidos por ela, percebemos que, mesmo sendo oriundos da cultura popular, tinham certa lógica. Bom, o vinagre, popularmente conhecido como ácido acético, tinha ação bacteriostática. E o pior é que tudo aquilo parece que funcionava!!!!

Certa vez, fui levado a conhecer parte da família que residia no interior de São Paulo. Depois de ser apresentado a primos e primas, sentamos na calçada da casa de uma de minhas tias. Neste momento, um cão enorme avançou sobre mim. Desmaiei e, não sei se fruto do susto, meu coração passou a apresentar fraqueza para bombear o sangue para meu pequeno corpo. Um dos diagnósticos clínicos da época sugeriu uma cirurgia. A família relutou e foi atrás de uma segunda opinião. Novamente veio a recomendação de que meu pequeno peito fosse apresentado a um bisturi. Mediante o desespero familiar, uma vizinha disse: “Conheço uma benzedeira que é fantástica”. Fui levado a ela praticamente desfalecido. Após sessões de rezas e de goles de chás recomendados por ela, que mesclavam uma série de plantas, curei-me e não precisei de nenhuma intervenção cirúrgica.

Pensei nisso tudo ao acompanhar o debate acerca dos fitoterápicos que tem ocupado os veículos de comunicação. Enquanto acompanhava a reportagem que, de uma forma maldosa em sua introdução, falou do poder das plantas e mostrou comunidades que acreditam nos ensinamentos milenares, questionei-me a mim mesmo, já que não tinha ninguém comigo, se tudo sempre esteve errado. Vários questionamentos invadiram minha mente: Será que minha mãe cometeu crime ao me tratar? Será que a benzedeira em nada acertou e fui curado pelo poder da fé? Quando se deu a diferença entre os ensinamentos gerados por diversas populações ao longo da evolução do ser humano e a ciência? Uma matéria que nos choca ao questionar o poder das plantas, tem por trás algo maior? Quem matou Odete Roitman? Eram os Deuses astronautas?

Cansado de tanto pensar, antes de puxar o edredom, preocupei-me com o impacto na sociedade de uma abordagem que, em princípio, traz equívocos. Creio na capacidade administrativa e intelectual dos que hoje ocupam cargos nos órgãos sanitários. Creio na seriedade com que as Políticas são implantadas em nosso País...e para Fitoterápicos existe uma. Creio que não existe “opinião isenta”. Se é opinião, não é isenta. Não tenho dúvidas de que a ciência deve prevalecer sobre as visões mágicas, como também não tenho dúvidas da seriedade que permeou a inserção dos fitoterápicos no SUS. Por via das dúvidas, antes de embalar no sono dos justos, dei um beijo numa folha do meu pé de erva-cidreira e tirei o  galhinho de arruda de trás de minha orelha. Boa noite!

9 comentários:

Lisia disse...

É Marcos, é preocupante que o cidadão brasileiro receba, dentro da sua casa, informações no mínimo equivocadas para não dizer, mal intencionadas. Como tu mesmo citastes tem uma Política por trás da Farmácia Viva. Este Doutor, se não conseguiu tentou, desacreditar esta Política. Estranhamente não me surpreendeu, era de se esperar considerando os interesses da emissora que veiculou o programa. O que me surpreende é o silêncio do Ministério da Saúde quanto a este episódio. Vai ficar por isto mesmo? A Globo, atendendo a interesses que não ficaram claros, faz questão de denegrir esta Política. O Ministério não vai questionar, não vai se posicionar, se manifestar? Vai deixar esta mensagem ser passada, durante quatro domingos, para toda população brasileira? Na entrevista da Revista Época Dr. Drauzio Varella afirma...É um absurdo dizer “olha, já que vocês não têm acesso à medicina se contentem tomando chazinho”. Também é dele a afirmação " muito mais barato fazer uma horta e mandar o médico receitar aquilo. E ainda inauguro o negócio com o nome de Farmácia Viva". Tem também esta pérola aqui "Que tipo de medicina o governo cria com uma medida como essa? Ele institui duas medicinas: a do rico e a do pobre". Se o Ministério não fizer nada vai parecer que a Globo, na figura do médico bonzinho Dr. Drauzio Varella, está certa. Estou aguardando, ansiosa, um posicionamento firme e embazado no conhecimento do MS. Abraço

Unknown disse...

É meu líder. Será que ninguém fará uma investigação séria sobre quem está bancando este Doutor?

Unknown disse...

Uma questão que nosso "grande doutor" não revela é que existe muito mais indicações com medicamentos cuja evidência é mínima do que ele mesmo imagina. Se formos ver as evidências de corticóides e de uma variedade imunossupressores ou imunomoduladores para alguns tipos de doenças, verá ao máximo algumas séries de casos, no famoso Pubmed. E isto significa que não funciona, que não deva ser utilizado? O uso consagrado de determinados medicamentos já efetiva a sua própria utilização pela comunidade médica.... e por que esse fato nao se aplica ao fitoterápicos?
A falta de evidências mais robustas, por si só, não significa que não haja benefício...
Além do mais se nosso aprecioso doutor quisesse se embasar em estudos para respaldar sua reportagem, é o mínimo de se esperar que se realize busca sistemática em uma série de bancos de dados, como o Scielo e o Lilacs, banco de dados formado por estudos realizados no Brasil e na América Latina (já que esses fitoterápicos disponiveis no SUS são nativos desta região).
Infelizmente a informação veiculada possui caráter puramente tendencioso, de uma grande formador de opinião, cuja forma de divulgação na tevê atinge velocidade cósmica no meio de nossa população.

Unknown disse...

Indignada também com esta série, me deparo esta semana adquirindo o novo Stockley de Interações Medicamentosas com Fitoterápicos, como literatura complementar para a disciplina de Atenção Farmacêutica... Quando será que essa emissora de TV vai parar de tentar monopolizar tudo??? E quando será que o Ministério da Saúde vai se pronunciar???? Eu e meus alunos estamos esperando por isso... Abraço

farmasantos disse...

Boa noite Marco e a todos,
O CFF enviou uma carta ao Dr. Drauzio Varella questionando as matérias que seriam veiculadas no Fantástico e esta é uma frase contida na carta resposta
"... Desde 1995 coordeno um projeto de pesquisa de atividade antineoplásica e antibacteriana em plantas da região do rio Negro, com apoio da Fapesp. Nossa extratoteca contém cerca de 2200 extratos, dos quais alguns mostraram intensa atividade antitumoral ou antibacteriana."...
"Ao contrário do que o senhor entendeu, para mim a Fitoterapia é um dos caminhos mais promissores para obtermos medicamentos eficazes e mais baratos do que os atuais. Talvez seja esse o futuro de uma indústria farmacêutica verdadeiramente nacional."
Com estas respostas como pode vir a publico em rede nacional para colocar a fitoterapia como simplesmente uma crendice popular?
Uma pessoa publica e renomada como o Drauzio Varella, que inclusive participa de várias campanhas do Ministério da Saúde deveria no mínimo ter mais responsabilidade perante a saúde publica.

Augusto disse...

Fantástico!! Sensacional
Gostei da Opinião!

ALEXANDRE disse...

EU ACHO QUE A RELAÇÃO ENTRE A CIÊNCIA E A FÉ E TOTALMENTE SADIA,
ME IDENTIFICO MUITO COM SUA EXPERIÊNCIA POIS ACREDITO NASCER UM POUCO A MAIS QUE MEIA DECADA A FRENTE DA SUA E PANO BRANCO (DOENÇA DE PELE), ALTAS FEBRES E ATÉ MESMO DOR DE DENTE, FORAM CURADA COM RECEITAS MILENARES, MAIS ENTENDO QUE HÁ EXAGEROS, E SABER QUE EXISTE O MERCADO PARALELO DA SAÚDE ME PREOUCUPA - ACHO QUE CABE ATE UMA CAMPANHA DO MINISTÉRIO DA SAUDE QUE VISUALIZA EXATAMENTE ESSA SUA EXPERIÊNCIA SEGUIDA DE UMA PESQUISA NACIONAL BASEADA NESTE TIPO QUESTINAMENTO, COM NUMEROS CLAROS DA AUTO MEDICAÇÃO QUE VAI DO CONSUMO SEM PRESCRIÇÃO MÉDICA ATÉ AS RECEITAS MILENARES QUE CURAM ALGUNS E PROCRASTINA OUTROS ATÉ AS CAUSAS MAIS CRÔNICAS.

Follow Iraheta disse...

Dr. Marco, acompanhei a polêmica da cobertura sobre fitoterápico via Ascom. Discordo dessa defesa enfática do Dráuzio Varella contra a política do MS para esse tipo de medicamento. Ele disse algo como: "é uma forma de dividir o tratamento médico no SUS para pobres e ricos. Os pobres ficam com fitoterápicos". Que bobagem! Acho que a cultura popular nos ensina muito sobre formas de cura e recuperação diversas, a depender do problema. Vide suas experiências e algumas minhas. Já tomei uma vez uma garrafada de uma goiana querida para dor de garganta - e foi muito preventivo! =) Vou add seu blog a meus favoritos. Abraço.

susan karen aquino disse...

olá Marco!!
se as Plantas forem usadas cautelosamente como qualquer farmaco na dosagem certa e na hora certa, são seguros e eficientes, Muitas pessoas acreditam que plantas por serem 'plantas' não oferecem perigo por isso o equivoco, e a má interpretação na televisão e etc...
Plantas tóxicas como as derivadas da digoxina as digitalicas em doses um pouquinho acima do padrão são totalmente Mortais!
portanto é somente uma questão de informção!