segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Diálogo sobre antibióticos.

No dia 26 de outubro foi publicada a RDC 44/2010 da ANVISA, que regulamenta a comercialização de antibióticos. Além das mudanças nas embalagens destes medicamentos, agora estes só poderão ser comercializados com a retenção de receitas. Argumentos não faltaram para tal decisão e não são novos. Entre uma das principais preocupações está o uso indiscriminado dos antibióticos, que podem gerar graves problemas oriundos da resistência bacteriana, desenvolvida pelo uso irracional destes medicamentos.
Muitos me pediram para falar sobre isso no blog, mas preferi narrar o diálogo entre dois cidadãos, que acabei acompanhando sem querer. Não que não quisesse ouvir, mas não fora convidado para aquele “dedinho de prosa” entre os dois. Não vou relatar onde aconteceu, mas percebi que eram dois usuários de medicamentos conversando. Na transcrição, usei o símbolo xxxxx para ocultar o nome de patologias e medicamentos. Eis o diálogo:
- Pronto, mais uma regra nova. Como se não bastasse tudo o que já foi feito até agora, inventam essa. Antibióticos só com receita? Esses caras não têm o que fazer? É muita burocracia!
- Peraí...vai me dizer que tu é contrário? Rapaz, você não sabe dos problemas que isso pode causar?  A automedicação come solta e os antibióticos são usados até para gripe...O povo chega na drogaria e já pede pelo nome, sem nem perguntar se precisa ou não!
- Mas será que o povo sempre errou? Vai me dizer que todos os antibióticos usados foram de maneira errada? Ninguém vai em médico por conta de dor de garganta. Já tomou um que funcionou e vai tomar de novo. Eu mesmo fui num médico uma vez. Ele me receitou xxxxxxxx . Sempre que tenho xxxxxxx, tomo de novo! Receitado foi, receitado está!
- Pronto, aí está o erro. Toma por conta própria. Não procura o médico. Assumiu o lugar dele. Até já faz o diagnóstico e....
-AH!!! Não vem com esse papo. Fala como se tivesse médico pra todo mundo! O SUS não funciona cara.
- Li uma matéria de um doutor que só faltou dizer o dia e a hora em que os antibióticos não vão funcionar mais. Fiquei assustado! Eu já não tomo remédio mesmo. Prefiro esperar e se não passar,  marco médico. Ou falo com o farmacêutico. O doutor disse que essa bactéria que pegou em Brasília, não lembro o nome, é culpa disso! O povo tá deixando esses organismos (SIC) mais fortes!
- Meu sobrinho que é farmacêutico meteu o pau nessa Lei (SIC). Disse que agora vai ter que ficar escrevendo no livro tudo o que vende ou que compra de antibiótico. Falou que não consegue mais trabalhar, só ficará na burocracia. Isso é coisa de quem não está trabalhando na ponta. Fica chutando coisas da própria cabeça.
- Mas porque ele não opinou quando abriram para o povo opinar?  Não comentou porque não quis. O farmacêutico vizinho de casa gostou. O médico da minha patroa disse que isso é bom! Até elogiou e disse que demorou para acontecer.
- Claro!!!!! Ele vai ganhar mais dinheiro, pois todo mundo vai ter que ir no médico. Isso é máfia rapaz. É coisa de médico com a indústria...
- Para com essa mania de perseguição cara. Você é cheio de teoria. Para a indústria não é bom não! Vão vender menos! E tem cientista falando sobre isso bixo!
- É burocracia!
- Não é não. Essa ANVISA está tentando por as coisas nos eixos. Tentou acabar com os remédios nas gôndolas. Tá moralizando a coisa. Pô, tem drogaria que vende até pinga!
- Porque não garantem saúde para o povo? Vai lutar por isso! Como não conseguem garantir saúde para o povo, fica nesse papinho! Isso é coisa desse Governo e...
- PAAAARAAAA. Lá vem você de novo com conspiração! Não dá pra conversar com você. Sempre  vai pra esse lado. Só fala isso porque teu candidato perdeu. Bom, vou embora. Pede a saideira que eu tô com o ciático incomodando.
- Tu tomou o que mandei??????

Bom, daí para frente não prestei mais atenção. Pedi a conta, paguei e fui embora. Mas o diálogo continua...quer participar?

* Imagem extraída do http://blog-nanevs.blogspot.com/2010_03_01_archive.html

Um comentário:

Anônimo disse...

Taí uma conversa agradável de se ouvir. Somos um pouco cada um dos interlocutores e, de alguma forma, precisamos levar essa conversa aos espaços públicos ou privados que frequentamos. Assumir o compromisso com a defesa da saúde de todos é mais que maturidade. É exercício amplo de cidadania! Não podemos conviver mais com a irresponsabilidade da falta de compromisso coletivo que tem se transformado a questão do "acesso" a medicamentos no Brasil. A RDC de nº 44 nos devolve parte de nosso respeito e dignidade. Isso é um Estado forte, presente, compromissado e cidadão.