Há quase três décadas, com a promulgação da Constituição cidadã, os brasileiros conquistaram direitos até então negados pelo regime ditatorial que esteve à frente da nação por 21 anos. O processo de redemocratização do país, em 1985, ocorreu com a mobilização da sociedade e dos movimentos sociais que, além de proclamarem o fim do regime militar, foram às ruas reivindicar sua participação na melhoria das condições de vida do povo brasileiro. E isso ocorreu em 1988, com a convocação da Assembleia Nacional Constituinte.
A Carta Magna estabeleceu, em seu artigo 196, que: “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Com isso, surgiu o Sistema Único de Saúde (SUS), que tem como objetivo principal a descentralização das ações, o atendimento integral da população e a participação da comunidade em todo o processo.
Porém, hoje o país passa por um momento em que muitas das conquistas garantidas aos cidadãos pela Constituição de 1988, como o SUS, estão ameaçadas por várias frentes. Uma delas se refere a projetos que tramitam na Câmara e no Senado. Além disso, ações adotadas pelo governo interino colocam em risco os direitos alcançados pela sociedade, principalmente na área de saúde e seguridade social. Uma delas é a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 241/2016, que institui novo regime fiscal para a União.
É importante lembrar que a PEC pode reduzir as despesas sociais nas próximas duas décadas, caso a proposta seja aprovada pelo Congresso. E isso será um ponto desastroso para a população — hoje, pelo menos 2/3 do orçamento do Ministério da Saúde banca a manutenção das unidades hospitalares, financia a aquisição de medicamentos, entre outras ações. Caso se leve adiante a defesa da PEC 241/2016, o país sofrerá retrocesso de três décadas.
Diante desse quadro e objetivando sempre a proteção do Sistema Único de Saúde, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) realizará, no próximo dia 6 (quarta-feira), a Marcha em Defesa da Saúde, da Seguridade e da Democracia. Um primeiro ato aconteceu em dezembro do ano passado, quando mais de 10 mil manifestantes de diversos segmentos da sociedade e de todos os Estados brasileiros se reuniram com o mesmo objetivo: a manutenção dos direitos adquiridos pela sociedade por meio da Constituição de 1988.
Desta vez, o objetivo é ir mais além. As entidades que farão parte da mobilização querem mostrar à população que é necessário, ainda, defender a seguridade social. A própria resistência às ameaças feitas ao SUS é uma forma de mostrar a necessidade de garantir a manutenção dos direitos sociais dos cidadãos, que incluem a Previdência e Assistência Social. Isso acontece em um momento em que o governo ataca o Sistema Único de Assistência Social (Suas), extinguindo, por exemplo, órgãos de extrema relevância para a sociedade, como o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
Isso vai de encontro ao que estabelece o artigo 194 da Carta Magna, que define como seguridade social as ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. E uma das bandeiras levantadas pela Marcha será justamente a preocupação de que este preceito seja mantido na agenda não só dos movimentos sociais, mas também dos governantes.
Também preocupa a sociedade a diluição do Ministério da Previdência nas pastas da Fazenda e do Desenvolvimento Social e Agrário. Isso poderá acarretar ampla reforma no setor, que deverá atingir também a Consolidações das Leis do Trabalho (CLT), uma conquista que o trabalhador brasileiro obteve em 1943, durante o governo de Getúlio Vargas. Os exemplos mostram que, ao limitar as ações voltadas para setores prioritários para a população brasileira, o governo atinge frontalmente os direitos adquiridos pela sociedade ao longo dos anos, a partir de 1988.
Somente com a mobilização da sociedade brasileira e dos movimentos sociais podemos barrar o cerceamento dos direitos adquiridos pela população. A cada dia as ameaças se aprofundam, mas é necessário que os trabalhadores resistam de forma organizada para que as conquistas sejam mantidas. Além disso, é preciso dialogar com a classe política para que ações voltadas principalmente para a saúde e a seguridade social não sejam prejudicadas pelo Congresso, como sinaliza a atual conjuntura nacional. Nós, brasileiros, não podemos aceitar nenhum passo atrás.
Ronald Ferreira dos Santos
Presidente do Conselho Nacional de Saúde
Presidente do Conselho Nacional de Saúde
Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/ultimas_noticias/2016/07jul05_Artigo_publicado_Edicao_04072016_Correio_Braziliense.html
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