Quem é pego com o
medicamento Pramil, popularmente conhecido como falso Viagra, deveria ser
julgado pelo crime de contrabando, tipificado no artigo 334-A do Código
Penal, e não pelo 273, que trata de crime de falsificação de remédios e tem a
pena muito maior. Esse é o entendimento do desembargador federal Paulo Fontes,
do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que expôs sua visão sobre o tema em
sessão da 5ª Turma no dia 25 de abril.
O caso concreto é o de um réu
que trouxe o remédio do Paraguai. Foi denunciado pelo Ministério Público
Federal em Ourinhos (SP) por falsificação de medicamento. A acusação pedia pena
de dez anos de prisão em regime inicial fechado. O juiz o absolveu e o MPF
recorreu da decisão.
O relator do recurso, desembargador
André Nekatschalow, deu razão ao Ministério Público e condenou o réu, mas o
desembargador Paulo Fontes divergiu, como vem fazendo a respeito da matéria.
Para ele, a importação do medicamento não deve ser analisada à luz do
artigo 273 do Código Penal, que prevê a pena mínima de dez anos. Ele afirma que
esse enquadramento implica em uma punição muito mais gravosa do que deveria ser
um crime de perigo abstrato – quando há apenas a possibilidade de o crime
causar algum dano a terceiros.
Em sua divergência, Fontes fez um
paralelo com réus que são flagrados com 20 quilos de cocaína e recebem
a mesma pena pelo tribunal. Para o desembargador, a lei sobre os remédios
falsificados é rigorosa demais e os casos precisam ser analisados um a um para
não se cometer excessos.
Lei dura
Em julgamento similar, o desembargador
já alertava que "é preciso levar em conta que a atual redação do
artigo 273 do Código Penal e o endurecimento de suas penas datam
de 1998, época em que se verificou um escândalo público sobre o que ficou
conhecido coloquialmente como 'remédios B.O' (bom para otário), ensejando
até mesmo a instalação de uma CPI. O espírito da lei, pois, é de combate à
falsificação e adulteração dos medicamentos, condutas de extrema gravidade e
que foram como tais apenadas pela alteração legislativa, fixando-se a pena
mínima em dez anos de reclusão. Recomenda-se parcimônia no enquadramento
típico, sob pena de cometer-se severa injustiça".
O crime de falsificação de substância
alimentícia ou medicinal já era previsto no Código Penal, mas depois de uma
série de escândalos relacionados à falsificação de medicamentos, foi editada
a Lei 9.677/1998 (a Lei dos Remédios), que trouxe diversas modificações ao
texto anterior. O novo texto legal passou a tipificar as condutas de
falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins
terapêuticos ou medicinais (artigo 273 do CP), cuja pena alcançou o
patamar máximo de 15 anos de reclusão (antes a pena máxima era de
seis anos de reclusão). Além disso, foram incluídas diversas figuras
típicas equiparadas e sujeitas às mesmas penas.
Questão controversa
No TRF-3 a questão ainda gera
debate nas turmas competentes. A constitucionalidade do preceito
secundário do artigo 273 já foi questionada no Órgão Especial do TRF-3 por
meio da Arguição de Inconstitucionalidade 2009.61.24.000793-5, de relatoria da
desembargadora federal Márcio Moraes (aposentado). Por maioria, o preceito
foi declarado constitucional. Entendeu-se que não é razoável a
desclassificação para o delito de descaminho, por existir no diploma legal
tipo específico para a conduta.
O desembargador Wilson
Zauhy segue essa jurisprudência. "No crime de importação de remédios,
não se admite possa utilizar o preceito secundário de outra norma penal -
para corrigir suposta desproporcionalidade do legislador, pois tal procedimento
fere o principio da estrita legalidade previsto no artigo 5º,
XXXIX da Carta Magna e no artigo 2º do Código Penal. É dizer: é
vedado ao juiz atuar como legislador positivo, por mais excepcional que seja o
caso e por mais razoável que seja a analogia feita", fundamenta.
No entanto, em julgado do próprio
desembargador André Nekatschalow, foi dito que "somente a importação de
diminuta quantidade de medicamento para uso pessoal não causa potencial lesão
ao bem jurídico tutelado pela norma penal do artigo 273,
parágrafo 1º-B, do Código Penal. Nesse sentido, o Superior Tribunal de
Justiça não reconheceu o reduzido grau de reprovabilidade ou a mínima
ofensividade da conduta em hipótese de apreensão de 59 comprimidos de Pramil
(STJ, RHC 31352/RS, Marco Aurélio Bellize, julgado em 11/4/13)".
Na sessão da 5ª Turma dessa
segunda-feira (28/4), o desembargador Paulo Fontes pediu vista do
caso. Maurício Kato, terceiro julgador do acórdão, irá se manifestar tão
logo o julgamento seja retomado.
ACR 0000198-19.2013.4.03.6125
(2013.61.25.000198-2)
Disponível
em: http://www.conjur.com.br/2016-mai-02/crime-falsificacao-remedios-tema-controverso-trf
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