Extraído do site da JOTA e INTERFARMA
Entenda o caso através da matéria feita pelo site JOTA, intitulada "Ricardo Barros faz cruzada contra exigência do próprio Ministério da Saúde"
"O ministro da Saúde, Ricardo
Barros (PP-PR), elegeu uma exigência da Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) para importações como principal entrave à redução de custos
em compras judicializadas de medicamentos para doenças raras. Trata-se da
Declaração de Detentor do Registro (DDR), um documento concedido por
fabricantes a empresas distribuidoras das drogas.
A DDR, no entanto, também é cobrada pelo
próprio Ministério da Saúde das empresas contratadas recentemente para
distribuição de medicamentos. A Pasta confirmou ao JOTA que a falta
deste documento pode levar à desclassificação da companhia selecionada.
Os editais do governo para compra dos
medicamentos Aldurazyme, Fabrazyme, Myozyme e Soliris, abertos a partir de outubro de
2017, pedem às empresas que
participam da disputa a apresentação da DDR. São os casos de maior repercussão
em que a Anvisa barrou as importações, somadas em mais de R$ 100 milhões, por falta ou suspeita de falsificação do documento que o
ministro quer dispensar.
A autarquia declara que, sem a DDR, há risco de
liberar lotes falsificados de medicamentos. “Não tem nada a ver com monopólio,
e sim com a apresentação de documentos obrigatórios em qualquer país que tenha
sistema regulatório preocupado com a qualidade, segurança e eficácia dos
medicamentos”, afirma a Anvisa.
Questionado, o ministro Ricardo Barros
respondeu de forma tangencial se havia contradição em pedir a derrubada na Anvisa
de um documento exigido pela própria Pasta:
“Não [há contradição]. Porque estamos falando
de compras emergenciais. Este assunto já foi esclarecido pelo nosso
departamento de compras. Eu não tenho dúvida de que estamos fazendo o correto:
não podemos estar submetidos ao fornecedor”, disse ao JOTA.
Empresa
confirma exigência
A Global Gestão em Saúde S. A., contratada
por R$ 20 milhões para distribuir Aldurazyme, Fabrazyme, Myozyme, confirmou que
houve a cobrança da DDR pelo ministério. A empresa, porém, considerou a
exigência um “instrumento de proteção comercial”:
“Apesar da DDR constar como um dos itens de
documentos da lista da tomada de preços, ela é um instrumento de proteção
comercial ao distribuidor Sanofi Genzyme do Brasil e não poderia ter sido exigida”,
disse a Global.
A distribuidora também declara que tem
empresas controladas ou parceiras credenciadas pela Sanofi Genzyme, fabricante
das drogas.
A Sanofi Genzyme afirma em nota que tem estoque suficiente para abastecimento
imediato dos medicamentos no Brasil.
A Global tem uma liminar favorável para derrubar a
exigência da DDR na hora da importação. O ministro Barros usa a decisão da
Justiça como argumento contrário à cobrança da declaração.
Soliris:
compra tapa-buraco de R$ 87 milhões
O Ministério da Saúde fez, em 5 de março,
nova compra (extrato) do medicamento Soliris, no valor de R$ 87,45 milhões.
O contrato foi autorizado por Barros após reunião, em 28 de fevereiro, com
associações de pacientes.
A medida preenche um buraco deixado pelo
imbróglio com a Tuttopharma LLC, empresa de Miami contratada pela Pasta por R$
84,08 milhões, que teria apresentado DDR falsa à Anvisa.
A nova compra foi firmada com a Multicare. A
companhia é credenciada pela fabricante do medicamento, a multinacional
Alexion. O número de frascos adquiridos, 6.425, é o mesmo da soma dos quatro
contratos firmados entre o governo e a Tuttopharma LLC para distribuição do
Soliris.
A falta do medicamento Soliris por cerca de
cinco meses causou a morte, em 26 de fevereiro, da cientista
social Margareth Maria Araújo Mendes, 45 anos. Ela era representante
nacional de pacientes com HPN e Síndrome Hemolítico-Urêmica Atípica (SHUa).
Após o óbito, associações de pacientes distribuíram em gabinetes do Congresso
Nacional lista de vítimas por desabastecimento de medicamentos.
Além de negativa da Anvisa para importação, o
ministério informou que a Multicare pede na Justiça anulação dos contratos com
a Tuttopharma LLC. Neste cenário, a tendência é que os medicamentos demorem
para chegar aos pacientes por meio da empresa de Miami.
A Pasta informa em nota que deve insistir no contrato com a Tuttopharma LLC,
apesar de ter feito uma compra complementar. “As compras com este fornecedor
estão em fase de instrução processual, pelo Ministério da Saúde, e aguardam
autorização da Anvisa para importação e posterior entrega do produto.”
O diretor do Departamento de Logística do
ministério, Tiago Pontes Queiroz, declarou que o representante da Tuttpharma
LLC no Brasil foi acionado para esclarecer se apresentou DDR falso à Anvisa.
A Tuttopharma LLC não responde às perguntas
do JOTA desde
28 de fevereiro.
Judicialização
A União destinou R$ 1,02 bilhão para compras
judicializadas de medicamentos em 2017. Do total gasto, 11 drogas (citadas
na página 41 de uma apresentação feita por Barros)
correspondem a 92% do valor (R$ 965,2 milhões), segundo o Ministério da Saúde.
De 2010 a 2017, houve um aumento de 1.010% nos gastos da Pasta com este tipo de
aquisição.
O Ministério da Saúde criou em outubro de
2017 um núcleo de judicialização, formado por 15 advogados, seis
farmacêuticos, três médicos e cinco servidores administrativos. A ideia,
segundo a Pasta, é cobrar exigência de relatório médico e receituário
atualizado de pacientes que recebem as drogas por decisões na Justiça. O
ministério afirma que 108 pacientes desistiram do processo após solicitação de
laudo médico.
A Pasta também lançou, em parceria com o
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o e-NatJus. A ferramenta é um cadastro
nacional de pareceres voltados a magistrado em ações sobre distribuição de
medicamentos.
O JOTA conversou
com dirigentes da Anvisa, distribuidoras e fabricantes de medicamentos sobre o
impasse na compra de drogas para doenças raras. Em comum, há a visão de que o
caminho para reduzir custos é aperfeiçoar a política de inclusão de drogas ao
SUS.
O Ministério da Saúde afirma que trabalha na
elaboração de nove Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT),
citados na página 30 desta apresentação. O PCDT é documento
essencial para orientar ações de gestores do SUS.
Os dirigentes da Anvisa consultados
concordaram que fabricantes têm autonomia para formar monopólios com
distribuidoras. Porém, disseram que a DDR deve ser cobrada para garantir a
segurança na distribuição. “O ministério não pode combater essa prática
[monopólio] com a entrada de empresas aventureiras”, disse um dos
entrevistados.
Um representante de fornecedora multinacional
afirma que o ministério mudou a política de contratações em outubro de 2017,
quando abriu cotações de preços para compras emergenciais de medicamentos de
alto custo (citados na página 41). Nestes processos, empresas sem tradição em
distribuir drogas para doenças raras apresentaram propostas mais baixas e
venceram os contratos.
A disputa ganhou corpo quando a Anvisa barrou
a licença de importação para empresas sem DDR. Com isso, as compras foram
judicializada e Ricardo Barros começou uma ofensiva contra a cobrança da
autarquia — ainda que o mesmo documento tenha sido pedido pelo Ministério da
Saúde em edital.
Na opinião do dirigente de uma fabricante
interessada em trazer ao Brasil novos medicamentos para doenças raras, a
disputa deixa o mercado pouco transparente e imprevisível.
As associações de pacientes assistem à
disputa com receio de que uma guerra de liminares impeça a distribuição de
medicamentos. A Associação dos Familiares, Amigos e Portadores de Doenças
Graves (AFAG) afirma, em nota de 26 de fevereiro, que ao menos 13 pacientes
morreram desde junho de 2017 por falta de medicamento que deveria ser
distribuído por determinação judicial. A associação também declara que há 500
pacientes desassistidos".
Sobre isso, associações do setor farmacêutico publicou uma carta intitulada "Em defesa da saúde da população brasileira"
"Diante da onda de críticas injustificadas que alguns gestores públicos de saúde e setores da imprensa vêm dirigindo, nos últimos dias, à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), as principais entidades representativas da indústria farmacêutica no Brasil se sentem no dever de expressar o seu apoio ao trabalho que o órgão vem realizando.
A pretexto de comprar medicamentos de alta complexidade, aparentemente mais baratos, gestores públicos pretendem importar produtos sem nenhum certificado de autenticidade e de origem, passando por cima das regras sanitárias que a Anvisa, a indústria farmacêutica e o Ministério da Saúde instituíram num árduo e longo processo de aprimoramento do mercado farmacêutico brasileiro, visando garantir a qualidade dos medicamentos utilizados em nosso território.
Não se trata de mera questão comercial e burocrática, como se pretende fazer crer. O que está em questão é a qualidade e a eficácia dos medicamentos consumidos no país. Quando o gestor público, federal, estadual ou municipal, decide desconsiderar regras sanitárias básicas, está pondo em risco a saúde da população brasileira. Um contrassenso!
Inspeções internacionais de fábricas e produtores de matérias-primas, solicitadas pelas empresas e remuneradas através do pagamento das Taxas de Fiscalização de Vigilância Sanitária, guias especiais de importação, apresentações de certificados de origem, obrigatoriedade de bulas e embalagens no idioma pátrio etc. são procedimentos e documentos normais e necessários do complexo sistema de produção e distribuição de medicamentos.
Detalhadas e rigorosas, essas normas são fundamentais para garantir que a população brasileira consuma medicamentos seguros e eficazes. Por isso, a indústria farmacêutica concorda com elas e estranha a atitude de autoridades que, inadvertidamente, atuam para destruir o consistente arcabouço regulatório sanitário instituído no país.
O trabalho e as regras da Anvisa não são perfeitos, nem a relação entre o setor regulado e o órgão regulador é isenta de divergências e polêmicas eventuais. Mas a seriedade e a capacitação técnica da Agência são inegáveis.
Se hoje os medicamentos fabricados no país são exportados e se equiparam aos melhores do mundo, a indústria farmacêutica reconhece que um estímulo importante para este desempenho veio dos altos padrões definidos pela Anvisa.
Esses altos padrões de qualidade e controle precisam ser mantidos e aprimorados, e não afrouxados, para que a Anvisa continue a ser um alicerce do sistema de saúde no Brasil, zelando pela dispensação de medicamentos seguros e eficazes".
Reginaldo Arcuri
Presidente Executivo
GRUPOFARMABRASIL – Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica de Pesquisa e de Capital Nacional
Antonio Britto
Presidente Executivo
INTERFARMA - Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa
Telma Salles
Presidente Executiva
PRÓGENÉRICOS - Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos
Nelson Mussolini
Presidente Executivo
SINDUSFARMA – Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo